Abril/2010 (by Paula Veit)
Por Luis Fernando Veríssimo
"Já se disse que a alma ibérica se divide em duas, uma mais caliente e a outra menos, e que Portugal é uma Espanha ponderada. A divisão estaria evidente na tourada, essa metáfora para todas as dicotomias humanas. Na Espanha matam o touro, em Portugal apenas o chateiam. Ainda não se chegou a um acordo sobre o que, exatamente, toureiro e touro simbolizam. A metáfora não é clara. Razão x instinto? Cultura x natureza? Ou - como li em algum lugar - tudo não passa de um ritual de sedução, como o Homem subjugando a Mulher, a Besta Primeva e todos os seus terrores, numa espécie de tanto sangrento em que não falta uma penetração no fim? Ou o toureiro gracioso é a mulher estilizada e o touro resfolgante uma paródia de homem? Enfim, seja o que for que se decide numa arena de touros, os espanhóis terminam o ritual, os portugueses deixam pra lá.
Pensei nisso lendo sobre o livro que saiu na Argentina, no qual pela primeira vez líderes militares da época, inclusive o presidente Videla, reconhecem em entrevistas as atrocidades cometidas durante a última ditadura deles. No Chile, o processo contra Pinochet revelou os crimes da repressão e permitiu que, aos poucos, a história ainda não contada dos anos terríveis se incorpore à história oficial do país - para ser reconhecida e expiada, para que reconciliação não signifique absolvição, para que nunca mais se repita. No Brasil, a repressão foi menos assassina do que na Argentina e no Chile - se é que se pode falar em graduação de barbaridade - e ninguém teve que dar muitas explicações. No caso, a simpática irresolução portuguesa desserve a história. Pois se o touro continua vivo, o que há para expiar? Aqui, venceu o deixa-pra-lá-ismo.
Já que temos de ser ibéricos, é melhor ser português. Vive-se mais longe do coração selvagem da vida, com menos drama e menos sangue. E, vez que outra, também é uma boa desculpa."
Algumas imagens que fiz da tourada que assisti em Abril de 2010 na "Plaza de Toros" em Madrid, Espanha:
(eu amo essa fotografia, inacreditável que "ela" tenha acontecido...)
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